domingo, 17 de janeiro de 2021

TIA FILÓ E A FILHA EMPRESTADA.

 

 

Maicon despertou e abriu os braços numa longa espreguiçada, e sua mão tocou a cabeça de Gislaine que dormia ao seu lado: - Hei! Acorda preguiçosa! – fez-lhe um cafuné e riu.

Ela se limitou a um grunhido quando ele se levantou seguindo ao banheiro. Ela ainda se aninhou mais um pouco na cama e pegou seu celular. Havia mensagens de sua mãe e, irritada, resolveu bloqueá-la. Depois virou de lado buscando mais uns minutos nos lençóis

No café, ela estava calada. Então Maicon perguntou: - O que tá pegando Giza? Tu tá com raiva de mim?

Deu de ombros: - Porque eu teria raiva de você?

- Então o que está acontecendo?

Ela mostrou seu celular: - Minha mãe está me mandando mensagens querendo falar da tia Filó. Não abri nenhuma, e como ela não parou, eu bloqueei minha mãe.

- Tu não quer saber o que tua mãe quer?

- Pra quê? É sempre a mesma coisa: “eu não devia ter feito isso; coitadinha da titia, ela não merecia!” – jogou o telefone na mesa: - Hipócritas; ninguém gosta dela! Chamavam de velha unha de fome que só queria saber de juntar dinheiro! Ela já estava com mais de oitenta anos; ia fazer o quê com o dinheiro? Forrar o caixão?

- Tu arrependeu de ter passado a mão na grana dela?

- Não! De qualquer jeito ia cair na mão da família depois que ela morresse; aí sim, ia dar muita briga! – deu de ombros novamente: - Agora não terão por que brigar, porque é tudo nosso! – ele espichou e a beijou. Depois tomou o restinho de café da xícara, e se levantou, dizendo: - Volto pro almoço amor!

Ela sorriu e Maicon saiu.

Gislaine encostou-se ao respaldar da cadeira pensando na vida boa que estava tendo, com dinheiro aplicado em ações e imóveis. – Coitadinha da titia! – sussurrou em tom de zombaria.

Então foi ao quarto se arrumar para seguir á academia quando a campainha tocou. – Ah não Maicon; esqueceu a chave outra vez? – ele sempre esquecia e voltava para buscar, tocando a campainha.

Ela abriu a porta e quase caiu para trás de susto: era sua Tia Filó acompanhada de um homem de quepe. Gislaine temeu ser um policial, até Filó falar: - Ah, então é aqui mesmo que você mora. – virou-se ao homem: - Jarbas; pode me esperar no carro. A conversa aqui será longa!

- Sim senhora Filomena. – e saiu.

As duas ficaram se olhando até Filó perguntar: - Vou poder entrar? Estou cansada! – e já foi entrando, devagar. Usava bengala: - Que apartamento porcaria! – bateu a bengala no chão: - Esse piso aqui é o mais barato que tem. Aposto que foi ponta de estoque!

- O apartamento é alugado! – respondeu.

- Mesmo assim com o dinheiro que você e seu namoradinho vigarista me roubaram, acredito que daria para alugar coisa mais decente!... Me ajude a sentar! – Gislaine foi ajudá-la a sentar numa poltrona enquanto falava: - Onde está o tal do Maicon? – riso: - Nome de pobre!

- Ele foi trabalhar.

Já ajeitada: - Eu imagino! E qual a função do moço? Roubar algodão doce na porta de escolas?

Gislaine pôs a mão nos quadris e falou: - Olha só tia; se veio aqui me ameaçar, já vou avisando que a senhora não tem como provar nada!  Ainda tenho as procurações e o atestado de sanidade psiquiátrica provando que a senhora estava lúcida quando me outorgou sua procuradora e...

Cortando-a: - Pode parar por aí Giza; eu sei bem que a cilada foi bem armada pra me enganar, não precisa enumerar suas pilantragens. Além disso, estou velha demais para tolerar as barras dos tribunais! Qualquer decisão judicial demoraria tanto pra sair que teriam que me comunicar no cemitério.  Não vim aqui por causa disto, fique tranquila!

 - Está bem tia. O que a senhora quer então?

Filó olhou-a bem e disse: - Eu estou precisando de uma filha!

- O quê? – abanou a cabeça: - Se a senhora veio aqui atrás de uma babá, estou fora!

Ela riu: - Não tenho a menor dúvida disto Giza, mas não vim aqui atrás de pajem; estou precisando que você faça o papel de minha filha!

- Como assim?

- E quero que você finja ser minha filha!

Surpresa: - Pra quê?

- A história é a seguinte: há trinta e três anos eu conheci um rapaz na confecção em São Paulo; chamava-se Marco, era desenhista e fazia estampas para a fábrica. Moço muito bonito que gostava de coroas e eu era uma cinquentona ainda enxuta! – fez um muxoxo: - Então começamos um relacionamento. Não sei se eu me apaixonei por ele, ou se foi á vaidade de ter um garotão!

- Esta história não me é estranha, mamãe falou sobre isto.

Ela riu de novo. – Sua mãe e suas tias eram umas idiotas despeitadas! Mas, voltando ao caso: nós ficamos um ano juntos,... Até que eu fiquei grávida!

- Héim? – espantou-se.

- Isso mesmo. Eu achava que mulher da minha idade não pegava mais barriga e não tomei pílula. Então aconteceu. – suspiro: - Aí o Marco deu no pé! Deixou um bilhete pedindo perdão, e dizendo que não tinha cuca para ser pai!... Eu fiquei muito triste, e era gravidez de risco.

- A senhora tirou?

- Não precisou. Eu perdi o bebê! – abanou a cabeça: - Depois disto eu me fechei de vez ao mundo. Só que a gente esquece que este mesmo mundo dá voltas, e há uns dias Marco me encontrou. Pediu perdão por ter me abandonado, estava muito arrependido, e me procurou naquela casa de São Paulo, que você e seu namorado me roubaram! – a encarou por um instante e voltou a falar: - Como não me achou, ele arranjou um detetive, e conseguiu!

- Ah tia; pula fora! Deve estar mais velho e fudido!

- Engano seu Giza! – arregalou os olhos: - A verdade é que Marco era bilionário! – Gizlaine também arregalou os olhos, e Filó continuou: - Sabe esses garotões rebeldes que saem da mansão dos pais pra viver igual á pobre? Este era Marco Starkweather! O sobrenome lhe diz algo?

- Starkweather,... Da empreiteira?

- Esse mesmo!... – cerrou os dentes: - Esse mesmo que se enfiou na minha casa, e eu achava que era mais pobre do que Jó! – abriu os braços: - Ele está profundamente arrependido e quer reparar seu erro assumindo a filha e de quebra, quer assumir eu também! Ele não sabe que eu perdi o bebê, e nas contas dele o filho estaria com trinta e três anos, e como a única sobrinha que tenho nesta idade é você, resolvi te procurar oferecendo esta oportunidade!

Desconfiada: - E por que a senhora vem oferecer isto justamente á sobrinha que,... Acusa de tê-la roubado?

- Porque você não presta, mas não é burra, e gosta de dinheiro. Estou errada? – riso rouco: - Desde menina que eu vi a bisca que você ia virar, mas no fundo, você era minha sobrinha favorita!

- Qual é tia? Sobrinha favorita é uma pinoia; a senhora nunca me deu nada diferente do que dava á outras sobrinhas!

- E por que eu deveria dar se te achava suficientemente safa para se dar bem? E acertei né? Eu te coloquei na minha casa para me ajudar, e foi só eu cochilar para você me trair!

- Tá bem, tá bem, eu fiz isto! Mas o que a senhora ia fazer com tanto dinheiro e imóveis se não aproveitava nada?

- Então você resolveu aproveitar no meu lugar!

- Bem tia,... Mas eu não posso voltar ao passado.

Cortando-a: - Mas pode ajudar no meu futuro, e levando muita vantagem como filha de bilionário!

- Eu sou registrada como filha legítima dos meus pais; ele não vai acreditar!

- Vai sim! Eu disse que minha irmã e meu cunhado toparam assumi-la como filha para me resguardar do vexame de ser mãe solteira na meia idade!

- E se ele quiser exame de DNA?

- Minha filha; ele está tão louco pra te conhecer que se eu lhe apresentar uma chipanzé, como sendo a sua filha legítima, ele vai amar! – brincou com a bengala, e prosseguiu: - Eu estou velha. Quanto tempo você anos acha que terei pela frente; uns cinco anos á mais? Não quero passar meus últimos dias na casa da sua mãe ouvindo queixumes, ou num asilo para pobres. Ainda espero conhecer Paris, e é por isto que guardava dinheiro!  – breve pausa. - E então, vai topar?

Gislaine pensou um pouco e perguntou: - Como seria isto?

- Marco possui uma ilha no litoral de São Paulo, que é seu refúgio. Nós o encontraríamos na mansão da ilha.

- Uma ilha?... Por que lá?

- Por que ele é excêntrico! Hum,... Está bem: Marco ficou um tanto obcecado pela sua aparência jovem e exagerou em operações plásticas que deram errado, então prefere ficar escondido por lá. – Gislaine a olhou de lado, e Filó concluiu. – Se quiser pode conferir nas redes sociais! Ele não gosta que lhe tirem fotos e anda com lenços cobrindo o rosto! E então. Vai aceitar? – deu de ombros: - Se não quiser eu posso arranjar outra mulher que o faça, mas,... Apesar de tudo, você é família. Eu me sentiria mais segura!

- Eu,... Eu precisaria conversar com o Maicon primeiro. Posso responder mais tarde?

- Sim! – preparando para levantar: - Mas não demore muito porque ele está ansioso, e eu mais ainda!... Ajude-me a levantar! – a sobrinha a ajudou enquanto Filó Buscava seu celular: - Jarbas? Estou descendo!

Ao chegarem á entrada do prédio havia um imenso carro prateado. O motorista uniformizado veio ajudá-la. Gislaine quase caiu o queixo: - Nossa, que carrão!

- Sim Giza, é um Rolls Royce Phantom último tipo; não é maravilhoso? Pena que não posso mais guiar! – Jarbas abriu a porta e Filó concluiu. – Tenho seu contato e vou enviar mensagem. – Entrou no carro: - Não demore muito tá? Tenho pressa! Vamos embora Jarbas!

O carro saiu deixando Gislaine espantada.

 

Quando Maicon voltou, ficou abismado com o que Gislaine contou e foram direto á internet e ás redes sociais conferirem. Lá estava: Grupo Empresarial Starkweather S.A. – Caraaaca Giza: empreiteira, construtora, estaleiros, fábricas, obras no exterior! Vai ser rico assim na casa do cacete!

- Acha aí o tal do Marco! – logo o encontraram, e era do jeito que tia Filó relatou: excêntrico, avesso á badalações, solteiro e um dos homens mais ricos do Brasil cuja fortuna chegava á casa de R$2.000.000.000,00 incluindo participações em diversas empresas pelo mundo. – Virgem santa!... Isto é orçamento de cidade grande! – falou Maicon. – havia poucas fotos de Marco, quase todas o mostrando com rosto coberto por lenços, e algumas fotos antigas quando jovem: um hippie! Procurando mais um pouco, encontraram uma foto sem lenço com o rosto desfigurado por muitas cirurgias plásticas desastrosas: - Que horrível, parece um buldogue! – zombou Maicon.

- Não fale assim de papai! – riu Gislaine. Então buscou seu celular: - Tia, eu aceito! Quando podemos ir?

 

Em três dias Gislaine e Maicon chegavam á uma marina no Guarujá numa van negra guiada por Jarbas que os apanhou no aeroporto; tia Filó os aguardava. Estavam ansiosos pelo encontro, e Filó explicava que seguiriam á ilha numa lancha. Marco os estava aguardando.

 Então o telefone de Jarbas tocou; ele falou um pouco e explicou-se pedindo desculpas: - Senhora Filomena, ocorreu um lamentável desencontro de informações, e preciso retornar ao aeroporto de Guarulhos para buscar o Emir Ibrahim Al Khaleb que está chegando de Dubai! Sou o motorista que está mais próximo. – abanou a cabeça: - O doutor Marco ficará furioso!

- Ah meu deus! – lamentou Filó. – Então consiga alguém para pilotar a lancha, ou não teremos como chegar á ilha!

Maicon interrompeu: - Eu sei pilotar embarcações; já estive na marinha! – então Jarbas lhe explicou o modelo de lancha e o trajeto que deveria seguir. Enquanto isto Gislaine falava á Filó. – Estou tão nervosa!... E se ele não acreditar?

- Relaxe, minha filha. Marquinho mal pode esperar para conhecer sua filha; a mesma que ele abandonou. Coitadinho, ele se sente tão culpado!... Trate-o com carinho e ele vai te dar o mundo!

- Tia,... Eu nem sei como agradecer depois do que fiz...

- Shhhhhh; esqueça isto! O que quero como gratidão é usufruir das benesses de ser a mãe da princesa herdeira! – aproximou-se: - Mas mostre-se arredia pelo abandono do seu pai. Um pouco de culpa cairá bem agora!

Jarbas pediu desculpas mais uma vez e seguiu á van enquanto Maicon vinha dizendo que a lancha estava ancorada ao final do píer, e chamava Paradiso.

O trio seguia pelo píer ladeado por iates luxuosos quando tia Filó parou: - Ai,... Esta maldita artrite! Ajudem-me, por favor!

Gislaine e Maicon se colocaram lado a lado ajudando-a até chegarem á embarcação. – Lancha? – exclamou Maicon: - Uau!... É um iate!

Filó riu: - Não, fofo. Esta é a lancha! O iate é aquele! - apontou a outra embarcação luxuosa e imensa ao lado. – Para translado á ilha, Marquinho prefere este, que acha mais simples.

Os três embarcaram, e Maicon foi direto ao leme; tinha um quepe de comandante que ele não se furtou em colocar com um sorriso nos lábios carnudos. – É isto aí senhoras, bem vindas ao S.S. Paradiso! – e riu: - A ilha se chama Sunrise! – enquanto Maicon levantava a âncora, Gislaine ajudava Filó a se ajeitar enquanto olhava em torno com seus olhos brilhando.

Logo cruzavam o mar, e em minutos enxergaram a ilha onde despontavam os telhados de uma mansão atrás do arvoredo. Ao aproximarem, já foram avistando um pequeno píer onde duas figuras os aguardavam. – O mais alto é seu papai. A outra é a governanta. Fique de olho Giza; eu não gostei dela. É intrometida! – alertou Filó.

O iate se aproximou e aportou. Gislaine olhava seu pai de mentira: era alto calvo, usava uma espécie de túnica púrpura até os pés e trazia um lenço cobrindo o rosto. Era uma figura estranha. Ao lado, a governanta trajada á maneira inglesa, com cabelos pretos ajeitados num coque, olhava-os com semblante sério e desconfiado.

Gislaine ajudou Filó no desembarque, que foi fazendo a apresentação: - Aí está nossa filha Marquinho; como eu lhe prometi. – aproximou-se: - Dê tempo ao tempo. Ela tem mágoas pelo abandono. – olhou Gislaine. – Venha meu bem. Vamos passar uma borracha no passado; lembre-se do nome que esta ilha evoca: Sunrise, um novo nascer do sol nas suas vidas!

Ela desembarcou com olhos fixos no homem, que colocou as mãos em sinal de prece: - Meu deus do céu!... É a cara de mamãe jovem! – dirigindo-se á governanta: - Olhe Maureen. Não é incrível a semelhança?

- Eu não posso afirmar senhor. – fez um muxoxo: - Não conheci a falecida senhora Abigail quando jovem.

Marco se aproximou de Gislaine: - Minha filha,... Creio que a palavra perdão é muito pequena para compensar todos esses anos de abandono! Eu era apenas um jovem irresponsável,... Mas não há outra. – ajoelhou-se: - Perdão, minha filha! Perdão!

Ela se emocionou de verdade: - Não precisa fazer isto... Pai! – segurou-o pelas mãos: - Olhe; vamos fazer como a t... A mamãe falou: uma nova vida! – sorriu, dominando a emoção: - Não vai ser fácil, mas,... Vamos tentar!

Então Filó interviu: - Porque não entramos? Este sol quente não vai te fazer bem Marquinho. – dirigiu-se á Maureen. – Traga a bagagem de Gislaine e seu marido!... Por favor.

- Sim senhora Filomena! – respondeu rangendo os dentes.

Então seguiram por um passadiço de pedras ladeado por jardins belíssimos. Por trás das arvores, era possível ver quadras de tênis, futsal e uma piscina. Subiram por uma escadaria que dava numa ampla varanda cheia de plantas exóticas, e á entrada da mansão. Gislaine e Maicon não sabiam nem para onde olhar ante tanto luxo: legítimas cadeiras Barcelona; tapeçarias persas; lustres de cristal Bacarat coloridos e maçanetas douradas, folheadas a ouro! Aproximaram-se de uma mesa repleta de joias e relógios: - Olhe minha filha; sei bem que coisas materiais, não podem comprar amor e nem reparar mágoas, mas,... – pegou uma caixa cheia de colares: - Também sei que quando moças fazem quinze anos, ganham colares de pérolas, e aqui tem alguns!... Faça de conta que eu os dei no seu baile de debutante! – Gislaine mal acreditava: - E aqui, filha!... Eu não sei em que você se formou, mas sei que os pais devem oferecer anéis de grau aos filhos formados. Então, aqui tem uma joia para cada curso; medicina, direito, engenharia... Tem de tudo! E aqui,... Você é casada, e sei que é dever dos pais, ofertarem as alianças de noivado, e casamento!...

Maureen, carregada de malas, interferiu: - Não senhor! É o noivo que deve providenciar as alianças.

- Ah é? – falou Marco um tanto perdido: - Ah, mas a gente muda um pouco a tradição. Fique com todas elas meu amor! – olhou Maicon. – E você, meu genro! Olhe,... – pegou um estojo com vários relógios: - Acho que presente de sogro, é relógio, né? Fique com todos. São de ouro; nada de folheado! – Maicon arregalou os olhos naquela coleção onde o mais barato era um Rolex!

Marco colocou a mão no peito: - Estou tão feliz! Nunca imaginei que teria uma filha tão linda, e que ainda veio com um genro,... Que considero como um filho! – e abraçou Maicon, que retribuiu já com vários relógios nos pulsos.

Então Filó sugeriu: - Por que não deixamos nossos filhos descansarem um pouco? A viajem foi longa e cansativa.

- Oh sim,... Eu imagino! Maureen; leve-os á suíte, que já está pronta pare recebê-los nesta casa,... – olhou Gislaine. – Que agora é sua, minha filha:...Mas, vou lhe pedir algo. Dê-me um beijo!... Um beijo da minha filha. – ele levantou de leve o lenço, mostrando uma bochecha flácida e salpicada de pelos grossos, á qual ela não se furtou em oscular. – Muito obrigado meu amor! Descansem, e depois lhes mostrarei a Sunrise Island! – e passou a mão na bochecha sob o lenço: - Acho que nunca mais lavo meu rosto!

Ao chegarem á suíte, depois que Maureen saiu, Gislaine correu ao vaso para vomitar enquanto Maicon se debruçava sobre as joias na cama.

 

Á tarde andaram pela ilha. Marco ia mostrando as arvores e plantas raras trazidas de varias partes do mundo. A piscina abastecida com um poço artesiano; as saunas e todo um mundo de luxo que para ele somente agora teria significado, pois encontrou sua filha, que abraçava. Gislaine ainda sentia certa náusea do beijo, e torcia para que ele não quisesse outro. Depois seguiram á uma área que continha ruínas encravadas numa parte rochosa: - Nesta ilha teve uma fortificação no século XVIII! – explicava Marco: - Que foi destruída numa batalha contra piratas. E sobrou apenas esta ameia em ruínas. – apontou á uma elevação projetada sobre um rochedo. Aproximaram-se e Filó se desequilibrou, caindo ao chão. Marco foi socorrê-la; - Oh, que perigo! Machucou-se?

- Ela mostrou o joelho com um corte. – Ah droga!... Que velha desastrada sou eu! – Marco ajudou-a enquanto apoiava a mão no muro. – Ah não!... Sujei meu xale!... Meu preferido!

- Não se preocupe! Maureen!... Leve o xale á lavanderia imediatamente!

- Sim senhor! – respondeu apanhando-o com certo asco, enquanto Marco falava: - Está tudo bem, foi só um susto. Vamos fazer um curativo neste machucado, e lhes mostrarei a estufa! Tenho uma coleção de orquídeas maravilhosa! Depois iremos jantar, que tal?

 

Era inicio de noite quando um restante da luz crepuscular dourada ainda invadia o salão de jantar, onde uma farta mesa os aguardava: - Bem,... Como eu não sei o que vocês gostam, mandei fazer um pouco de tudo que tinha na cozinha! – explicava Marco: - Aqui tem faisão; frutos do mar; lagosta; caviar russo, iraniano; trufas francesas; este jamón espanhol defumado, hum, delícia! Arroz negro, vermelho, japonês,... Doces cerejas,... E bebidas: champanhe, uísque escocês; cervejas alemãs, holandesas e americanas,... Ah, esse aguardente do Vale do São Francisco que nem o santo recusaria! – riso: - Sirvam-se! – Maicon e Gislaine nem sabiam realmente o que escolher, então fizeram pratos com se fazem em comida á quilo, com um pouco de cada.

Era um tanto repugnante ver Marco comendo, usando uma mascara veneziana em forma de bico, enfiando colheradas por baixo e bebendo de canudinho. Filó se contentava com salmão grelhado enquanto trocava olhares afiados com Maureen.

Após a refeição, entre considerações culinárias, Marco falou: - Vocês trouxeram seus passaportes, não é? – eles assentiram: - Faremos uma viagem, direto á Modena, na Itália! – apontou á Maicon: - Quero levar meu genro á fábrica,... Ou melhor: ao templo da Ferrari!

- O quê? – Maicon até engasgou.

- Meu genro terá o privilégio de escolher a maquina que quiser, e da cor que desejar! – riu: - Ah não ser que meu genro não goste de Ferrari!

- Não!... Eu amo, eu amo!

Todos riram, e após rodadas de uísque Filó ensejou: - Poderíamos aproveitar, e falar do assunto do reconhecimento de Gislaine como sua filha legítima! Aliás, nossa filha.

- Sim Filó! Oh, só de pensar no vexame que fiz você passar, meu coração se despedaça de culpa! – olhou a governanta: - Maureen; traga os documentos!

- Se me permite senhor: talvez seja um assunto um tanto enfadonho para servir de sobremesa á um jantar tão magnífico! Não seria melhor deixar para amanhã quando os advogados estarão aqui?

Filó se irritou e falou: - Querida; obedeça ao seu patrão e traga os documentos! Meu genro é advogado e pode verificá-los.

Marco deu um arroto e, constrangido, falou: - Uh, perdão! Mas talvez Maureen tenha razão Filó. Estamos todos um pouco bêbados, e é uma leitura jurídica chata pra caralho! – riso: - Desculpem. – olhou Gislaine: - Mas,... Se você fizer questão, filha... Podemos passar ao escritório.

Ela hesitou, mas respondeu: - Ah pai,... Acho que podemos deixar para amanhã. – apontou Maicon já debruçado na mesa: - Meu marido agora não lê nem o bê-á-bá!

Ainda irritada. Filó respondeu: - Bem, vocês é que sabem; deixemos para amanhã então! Eu acho que vou me recolher. Estou muito cansada e, confesso que comi e bebi além da conta.

- Sim! – respondeu Marco. – Também estou exausto! – olhou Gislaine: - Mas não exausto de alegria. Esta é a noite mais feliz da minha vida! – estendeu á mão: - Seja bem vinda á minha vida, filha querida!

Ela a segurou: - Obrigada,... Papai! – mas temeu que ele quisesse outro beijo, e bocejou: - Nós também estamos com sono, não é Maicon?

- Hânnn? Sim, eu estou.

Então se levantaram, e antes de seguir á sua suíte, Marco falou: - Amanhã será um dia cheio!... Meus amores!

Filó chegou perto de Gislaine para desejar boa noite, e cochichou: - Você me deve isto héim?  Não esqueça que fui eu que a coloquei aqui! - olhou Maureen. – Esta piranha aí não perde por esperar!

- Claro, tia,... Quero dizer, mamãe. – e a beijou no rosto.

Depois Maicon e Gislaine seguiram á sua suíte entre risos e tropeços. Ainda passaram por Maureen que lhes desejou boa noite. Gislaine até arrepiou!

 

Entraram, fecharam a porta e caíram na cama aos risos! – Nunca vi tanta boia boa! – Falou Maicon enquanto abriu a calça: - A braguilha tá até arrebentando! – levou á mão para o alto da cabeceira, e havia um cesto: - Que porra é essa?

Gislaine a buscou: - É uma cesta cheinha de chocolate suíço!... Do bom!

- Não sei se aguento!

- Aguenta sim! – ela deu uma mordida: - Tem licor; prova amor! – ele comeu: - Puta que pariu: isso e maldade! Adoro chocolate! – e pegou outro e comeu de uma vez; - Putz,... A gente que nasceu no miserê, quando vê isso, nem acredita!

- Agora a fase de catar migalhas acabou amor,... – comeu mais um chocolate: - Amanhã o advogado vem aí, e me transformo na mulher mais rica do Brasil, iupiiii!

- E sua titia, a mamãe mais rica também!

- Hum,... A titia pode criar caso depois,... Vai querer mandar no dinheiro; eu conheço a peça!... Acho que poderemos colocá-la numa casa de repouso, dessas que parece SPA! – riu e se levantou para tirar a roupa.

Maicon também riu e buscou seu celular, - Ué,... Tá sem sinal!

- Ah,... Aqui tem que ser com Wi-Fi... Mas não peguei a porra da senha! ... – ela se jogou na cama, nua, já colocando a mão por dentro da calça de Maicon. – Larga essa merda de celular e vem trepar!

Ele deu um longo bocejo, mas respondeu: - Sim minha senhora,... Porra, que sono!

Ela o agarrou: - Esse barulho das ondas,... Ah meu deus...

 

 

A luz solar da manhã invadia o quarto quando irromperam batidas á porta: - Eles estão aí. Abram! – ouvia-se outra voz e mais batidas: - Abram esta porta!

Gislaine levantou a cabeça, que doía: - Ai,... Hum...?

- Abram a porta! – mais batidas.

- O quê? – despertou Maicon. - ouviram-se mais vozes: - Eu trouxe a chave mestra! – a fechadura destrancou e entraram homens uniformizados e um policial. Gislaine se assustou e gritou: - Ah!... O que é isso?

Maicon também se ergueu e ameaçou: - Hei, saiam daqui ou dou porrada!

Um dos homens respondeu: - Nós fazemos as perguntas por aqui; quem são vocês?

Ela se ergueu desnudando os seios, e rápido buscou o lençol para se cobrir. – Eu sou a filha do dono desta ilha,... Saiam do meu quarto ou eu chamo meu pai!

Os homens se entreolharam, e o policial perguntou: - Pai? Você é filha de quem?

- De Marco Starkweather; o dono de tudo isto aqui!...

Os homens se entreolharam até um homem de terno e usando um lenço na face entrar. Imediatamente Gislaine falou: - Papai; mande esses homens embora; eles invadiram meu quarto!

- Que diabo é isto de papai? – respondeu o homem irritado. – Está doida?

- Ela não é sua filha? – perguntou o policial.

- Eu lá tenho filha!

- Mas,... Mas...! – então ela notou que o homem tinha porte robusto, e mais cabelo: - Não,... Este homem é um impostor! Cadê meu pai?

- Então ela não é sua filha, doutor Starkweather?

- Eu já falei que não!

Gislaine retrucou: - Ele não é o verdadeiro Marco Starkweather, é um impostor!... Chame a tia Filó que ela vai confirmar!

- Quem? – perguntou o homem.

- Quero dizer, a senhora Filomena Cândida Costa, a mamãe!... – gritou: - Mamãe venha cá! Invadiram meu quarto! – enquanto isto outro policial entrou trazendo alguma coisa às mãos. – Tenente; veja o que encontramos: papelotes de cocaína. – outros policiais entraram e começaram a vasculhar as malas do casal, até que um alertou: - Tem mais aqui!

- isto não é nosso! – gritou Maicon. – Sou advogado, tenho meus direitos!

Outro homem uniformizado entrou: - Doutor Starkweather; fizeram uma limpa na joalheria do hotel. Levaram joias, relógios, alianças e os colares de pérolas!

- Hotel? – perguntou Gislaine: - Isto aqui é um hotel?

O homem do lenço respondeu. – Vou fazer de conta que a senhorita não sabe, ou está com a cuca cheia de droga, e vou responder: sim, é o Sunrise Island Resort, de minha propriedade! – seu lenço até inflava pelo bufar furioso. – E a senhorita, quem é?

Um policial respondeu com documentos na mão: - Ela é Gislaine Maria da Costa; e o distinto aí é Maicon,... – riso: - Maicon Jackson Cunha!... Hei, espere!...  – verificou no seu celular: - Há um mandato de prisão preventiva contra o doutor Maicon Jackson, por estelionato!

Gislaine olhou-o: - Que merda é essa? – ele respondeu: - É... É um processo em andamento,... Mas é calúnia! – o policial perguntou: - Qual nome de sua mãe, que a senhorita falou?

- Filomena Cândida da Costa! – olhou Marco: - O senhor a conheceu, não é?... Teve um caso com ela?

Ele foi enfático: - Caso? Eu deitei com muitas mulheres na vida, mas nunca ouvi falar desta pessoa!

O policial observou: - Há uma queixa de desaparecimento da senhora Filomena registrada na cidade mineira de Santos Dumont, feita pela sua irmã, a senhora Helenice Cândida da Costa, há uma semana! – imediatamente Gislaine lembrou: - Ah meu deus!... É isto que mamãe queria me dizer nas mensagens! – o policial completou: - Ih! Tem mais coisa: A senhora Filomena está movendo um processo que acusa sua sobrinha Gislaine Maria da Costa de apropriação indébita, roubo e estelionato! – apontou-a; - A sobrinha é esta mulher!

Assustada: - Ãh?... Ela disse que não ia mover!... – outro policial entrou no quarto trazendo o xale xadrez de tia Filó: - Tenente; encontramos esta peça com manchas de sangue presa á rochas na orla da ilha, e algumas pessoas afirmaram terem visto o casal aí andando no píer com uma idosa que usava um xale xadrez, que entraram no iate e depois zarpou rumo á esta ilha! – outro funcionário completou: - Há manchas de sangue naquele muro das ruínas, á beira dos rochedos! – todos olharam o casal na cama.

Gislaine colocou as mãos na cabeça e resmungou rangendo os dentes: -... Velha filha da puta!

 

 

Dias depois...

Um vetusto Citroën DS 19 vintage seguia pela Avenue Foch em Paris.

No banco traseiro, Filomena olhava os transeuntes na calçada lembrando-se do golpe de mestre que aplicou na sobrinha com ajuda de seu antigo namorado hippie, que realmente a encontrou ao abandono, e foi seu cúmplice perfeito na vingança, com auxílio de atores. – Ah Marquinho,... – suspirou: - Nunca é demais reencontrar um velho amor, e saber que era um bilionário! – e sorriu ao ver as torres de Notre Dame ao longe.

 

FIM!

 

 

 

 

3 comentários:

  1. UAU! Incrível! Maravilhoso! Parabénsssss!

    ResponderExcluir
  2. Que reviravolta espetacular da Tia Filó, hein Ramón? Por essa, nem eu esperava rsrsrs. Obrigada pela parceria! Parabéns!

    ResponderExcluir