quinta-feira, 28 de novembro de 2019

"que horrível esta gente feia que passa na nossa rua..."


A jovem espiava o movimento da rua pela janela do apartamento. Era pálida e seu olhar procurava algo especial por entre os transeuntes, e suspirou. – Que horrível esta gente feia que passa na nossa rua! – seu namorado estava sentado numa poltrona e reclamou: - Nunca tivemos um período tão escasso Ilona; precisamos de sangue novo!  – passou sua mão branca no rosto: - Tenho vontade de chegar á rua e pegar o primeiro que aparecer! – ela o repreendeu. – Está louco Thorko; quer que nos descubram? – e continuou à janela naquele fim de tarde quando algo lhe chamou atenção: um carro que parava em frente. – Thorko, venha ver! – saiu uma mulher acompanhada de uma linda garota cujos cabelos sedosos balançavam á brisa e entram no prédio; como seu apartamento ficava no térreo, conseguiram ouvi-las tendo dificuldade em abrir a portão do hall. – É agora! – falou Ilona.
A mulher estava embaraçada com as chaves e Ilona surgiu solícita, explicando: - É a chave pequena que abre a fechadura!  - ela tentou e conseguiu: - Oh, muito obrigada. Entre, filha! – a garota entrou, e era ainda mais linda de perto: alta, pele rosada e rosto arredondado com dois grandes olhos azuis. Thorko se aproximou e Ilona perguntou: - São moradores novos?
- Não exatamente: sou relações públicas e estou na cidade á trabalho.  Preferi alugar um apartamento de temporada; é melhor do que Hotel.
- Com certeza! Sou Ilona Joo; como você se chama?
- Sou Ana, e esta minha filha Betina! – a garota sorriu com lábios vermelhos mostrando dentes perfeitos e brancos. Thorko arregalou os olhos quando ela jogou o cabelo para trás mostrando seu colo e pescoço. - que moça linda; quantos anos você tem? – perguntou Ilona.
- Quinze. – respondeu com uma voz tímida.
Ana falou seguindo ao apartamento ao lado: - Iremos embora amanhã á tarde. Bem, muito obrigada! – a garota seguiu a mãe espiando os vizinhos com olhar desconfiado.
O casal retornou ao seu apartamento com Thorko se contorcendo de excitação. – Ela é perfeita, maravilhosa e linda,... Só tem quinze nos, e aposto que é virgem! Ah,... Só de pensar na pulsação adolescente que emana daquele corpo,... - Vamos bater na porta delas e acabar logo com esta aflição!
- Não podemos fazer isto; você se esqueceu das vezes que estivemos por um triz de sermos apanhados?... Mas eu sinto que vai acontecer algo a nosso favor.
- Mais uma dos seus sortilégios Ilona?
- Não Thorko; apenas um pressentimento!

Á noite, Ilona ouviu uma conversa no corredor: era Ana ao telefone: -... Não acredito que vocês vão me deixar na mão!... Avisam em cima da hora e não arranjam ninguém para ficar com minha filha enquanto trabalho? Isto é sacanagem!
“A ocasião bate á porta” pensou Ilona ao sair, simulando ajeitar o capacho, enquanto Ana prosseguia: - Querem saber de uma coisa? Vão á merda! – desligou o telefone e pôs a mão na testa, resmungando: - Tô fudida!
Ilona aproveitou: - Acabei ouvindo-a sem querer: algum problema?
- Problemão! Já estou arrumada para ir ao evento que vou trabalhar, até chamei o uber, e só agora a agencia me diz que não poderá mandar a babá para ficar com Betina! E quem me contratou deixou bem claro que não posso levar minha filha. Que droga; vou ter que desmarcar o trabalho;... É capaz de me despedirem!
- Ora; se você quiser, nós podemos tomar conta da sua filha! Não vamos sair hoje.
- Não quero incomodar; o evento vai acabar de madrugada.
- Sem problema algum, eu meu namorado somos notívagos! A não ser que você não confie em deixar sua filha com pessoas que não conhece.
- Oh não, vocês é que estão sendo bons com uma estranha!...  Mas,... Jura que não vai atrapalhar?
Ilona abanou a cabeça. – Claro que não! – Thorko chegou á porta e ela perguntou: - Não é amor? – ele respondeu. – Não vai incomodar nada; será um prazer!
Ana sorriu e respondeu: - Puxa gente: muito obrigada, nem sei como agradecer! Vou buscar Betina. – os dois trocaram olhares, e Ilona ouviu a garota resmungar antes de sair: - Eu não quero ficar com esses dois esquisitões! – Ana cochichou. – Fala baixo; são apenas góticos que gostam de andar de preto. Não seja criança Betina, por favor! – e saiu trazendo a filha enquanto olhava a rua pelo portão: - Meu uber chegou! Comporte-se héim; você é uma moça! Mais uma vez obrigada, gente, e qualquer problema, me liguem! Até mais! – e saiu correndo pelo portão ajeitando um casaco nas costas.
Então Ilona olhou Betina e lhe disse puxando a mão. – Vamos entrar? – eles á conduziram ao apartamento com paredes pintadas de preto, estofados em roxo, móveis antigos de madeira escura e outros adereços macabros. Betina olhava em torno com olhar receoso até se deparar com um retrato de dama antiga numa moldura barroca rebuscada. Fitou-o um instante e perguntou: - Quem é esta mulher, uma princesa? – Ilona respondeu: - Não; esta é a condessa Elizabeth Barthory, que há muitos séculos viveu num castelo lindo nas montanhas dos Cárpatos, na Hungria! – Betina perguntou. – É uma que era vampira? – Ilona sorriu e respondeu. – Nada disso, ela era uma mulher adiante do seu tempo, uma visionária! – Thorko vinha trazendo uma bandeja com um copo e á ofereceu: - Trouxe um refresco de frutas vermelhas; uma delícia, prove! – Betina tomou um pouco e gostou. Então Ilona a conduziu á um corredor enquanto falava. – Você gosta de jogos? – ela assentiu: - Então venha conosco,... Vai ser divertido! – Entraram num quarto e fecharam a porta.

Tempos depois num noticiário de TV: “A polícia continua sem pistas do crime ocorrido há quinze dias, quando foram encontrados os corpos de Maiconsuel de Almeida e Maria José da Silva, já em estado de decomposição ao lado de uma banheira cheia de sangue. O referido casal atendia pelas alcunhas de Thorko e Ilona Joo, e era procurado pela polícia por divulgar pedofilia pela internet, inclusive havia um estúdio fotográfico montado no apartamento para este fim, além de inúmeras fotos de meninas e adolescentes vestidas de vampiras em trajes sumários”...
Há uma sonora gargalhada no carro enquanto a garota afastava seus cabelos sedosos dos olhos ao dizer: - Casalzinho patético! Maiconsuel e Maria José se passando pelos meus mais fiéis vassalos; Thorko – que guiava o carro. – e Ilona. - no carona. – Queriam que eu fizesse fotos, quase nua, com uma capa e dentes postiços de plástico! Horripilante, para dizer o mínimo. Ilona, você foi perfeita no papel de Ana, a relações públicas! Mas aqueles dois idiotas serviram bem; eu precisava me banhar em sangue. – riso. – Tutorial de beleza da condessa Elizabeth: banhar-se em sangue é a garantia da aparência de quinze anos por quatrocentos e nove anos; acho que vou até publicar isto no YouTube! – novo riso. – Desde que nós fugimos da Hungria em 1610, eu nunca vi um século tão esquisito quanto este XXI. O casal não fazia sexo; como assim?  - gargalhada. - Eram dois pervertidos que se masturbavam vendo fotografias das meninas. Que século bizarro este!
- Para onde vamos agora Majestade?
- Hum,... Deixe ver aqui Thorko. – A condessa mexeu no seu notebook e assinalou. – Eu achei mais uma turminha postando pornografia infantil na rede! – abanou a cabeça. – Que feio, até pelas fotos está evidente que não fazem sexo! Juro que eu nunca vou entender isto.
- Aonde é Majestade?
- É num lugar chamado Juiz de Fora; que nome estranho! Thorko; pegue a BR 040 e siga pra esta cidade em que o juiz não mora lá. Quando chegarmos, veremos como agir! - a condessa recostou no banco traseiro do Porsche Cayman, pôs os óculos escuros e filosofou: - Pensem que estamos fazendo um serviço de utilidade pública, limpando o mundo desta corja de pervertidos! Quem sabe não entramos para a polícia?
Mais uma gargalhada quando o carro seguia pela estrada.

Fim

Nenhum comentário:

Postar um comentário