quarta-feira, 8 de abril de 2020

JAMPA


CONTINUAÇÃO:


QUARTO CAPÍTULO: AS ONDAS.

 

Na pensão Tom conseguiu retornar á chamada de Ciça, mas estava fora de área. Era preciso fazer algo imediatamente, então saiu em direção á Praia dos Coqueiros na intenção de chegar antes delas conversarem! - Estou perdido; mas é melhor que fique tudo claro e depois eu arco com as consequências! – pensou enquanto tentava seguir rápido pelas ruas da antiga cidade de João Pessoa. – Puta merda, parece que todo mundo resolveu sair de carro logo hoje! - reclamou enquanto buzinava agarrado numa rua estreita com trânsito se arrastando como um cortejo de lesmas.

O céu estava nublado e ventava muito. Puseram placas informando que banhos de mar e surf estavam proibidos por causa da ressaca e havia poucas pessoas, a maioria, turistas desapontados por não poderem entrar nas águas do mar bravio. Passaram-se vinte minutos de idas e vindas sobre os rochedos sem encontrar o menor vestígio das duas. Veio á esperança que tivessem desistido face ao tempo nublado que não convidava a passeios, ainda mais com o mar quebrando nas pedras em ondas furiosas.   Então ocorreu algo estranho: pessoas corriam para uma ponta rochosa e pareciam olhar para baixo, e um súbito temor lhe subiu pelo pescoço numa intuição terrível. Tom seguiu correndo ao grupo e avistou homens salva-vidas empoleirados nas pedras ante á arrebentação de vigorosa das ondas. Ele perguntou a um rapaz. - O que aconteceu? – ele respondeu: - Parece que uma mulher caiu no mar e as ondas a levaram; será que foi acidente,... Senhor? - Tom saiu de perto do grupo e resolveu descer á parte onde havia mais curiosos e policiais isolando a área. Um membro do Corpo de Bombeiros falava ao rádio em voz alta para vencer o rugido do mar solicitando um helicóptero. Demorou cerca de quinze minutos até a aeronave vir e flutuar sobre as águas com homens á beirada, vasculhando o mar com binóculos. De vez em quando pairava no ar para que pudessem observar algo e voltava á circundar. De onde estava Tom conseguia o bombeiro falando ao rádio que a vitima devia ter seguido ao sul com a maré.
Tom passava as mãos nos cabelos sentindo o suor que lhe escorria frio. O céu nublado parecia um mau agouro depois de vários dias ensolarados; logo naquele dia, nuvens pesadas embotaram o paraíso! Então decidiu ir ao hotel: quem sabe as duas estariam lá e aquele desespero era á toa? Pensou.
Ele chegou perto da entrada da portaria, mas se deteve porque um homem baixo acompanhado de dois policiais saía: era um delegado de polícia e informava aos repórteres que havia uma mulher suspeita que já teria se evadido, mas não poderia revelar seu nome ainda. Havia um grupo de pessoas ouvindo noticiário na TV e ele correu para ver: - Tragédia na Praia dos Coqueiros hoje por volta das dez horas quando uma mulher caiu ao mar de numa parte mais elevada dos rochedos. Guarda-vidas e bombeiros foram acionados, mas o mar em ressaca com vagas de três metros impediram que os homens entrassem nas águas. Foi acionado o helicóptero dos bombeiros que sobrevoou a área em torno dos rochedos, sem sucesso. Um casal de turistas que passeava nos rochedos afirmou ter visto duas mulheres discutindo, e num dado momento chegaram a dar empurrões. Os bombeiros continuam a busca pela mulher sem esperanças de encontra-la com vida”.
Ele pôs a mão na cabeça e andou de um lado a outro desnorteado. O homem que parecia ser delegado olhava em volta, e de súbito lhe correu um temor absurdo que alguém recordasse de tê-lo visto com Teca no buggy. Então correu de volta ao carro e voltou á pensão.

No quarto, Tom apanhou seu notebook á cata de notícias que pingavam á conta gotas: - “O casal de turistas que presenciou a discussão nos rochedos que resultou numa tragédia descreveu as mulheres como sendo ambas de estatura mediana: uma era morena clara de cabelos pretos até os ombros e estaria usando bermuda cáqui, camiseta regata rosa, sandálias com salto e uma bolsa laranja” – É a Ciça! – pensou aflito enquanto prosseguia. – “A outra mulher seria morena clara e trajava short jeans, camisa xadrez vermelha amarrada na barriga, chinelos ‘havaianas’, boné amarelo e aparentava ter cabelos curtos.”.  Teca! – “Mas a polícia ainda não conseguiu identificar”.
Mais tarde outra notícia trazia a informação de um motorista de táxi que teria apanhado as mulheres á portaria do hotel, que pediram para ir á Praia dos Coqueiros, e sua descrição batia com a relatada pelo casal de turistas.
Á noite uma última notícia informava do encerramento das buscas, que reiniciaria na manhã seguinte. Tom permaneceu sentado na cama com o notebook no colo até a madrugada, remoendo sua tristeza e remorso, quando vencido pelo cansaço adormeceu.
Era dez e meia da manhã quando ele despertou, e sua primeira providencia foi averiguar o noticiário: “O corpo de uma mulher correspondente á descrição da que caiu ao mar na Praia dos Coqueiros ontem foi encontrado boiando na orla da Praia de Cabo Branco e resgatado pelo Corpo de Bombeiros ás sete horas e vinte minutos desta manhã.” – Ao ler a notícia Tom sentiu um forte aperto no peito. – “A polícia encontrou as irmãs Celeste de Souza Vergara e Cibele de Souza Vergara nos registros do hotel. Concluíram que Cibele é a mulher que morreu no mar. A direção do hotel informou que Celeste de Souza Vergara deixou o hotel com bagagem ás onze horas e trinta e cinco minutos de ontem com paradeiro ignorado. As duas mulheres são da cidade Juiz de Fora, MG. e estariam hospedadas á cinco dias.”. - Tom tinha certeza de que o motivo da discussão que terminou em tragédia foi exatamente ele.
De repente aquele quarto começou a ficar sufocante nas lembranças de Ciça que emanavam em cada canto, e ele saiu á rua. Pessoas comentavam sobre a tragédia na Praia dos Coqueiros, e veio novamente o temor de alguém se lembrar de ver Ciça se encontrando com um homem naquela pensão; o que não seria tão fácil, pois ela sempre ia com chapéu de palha, óculos escuros e echarpe cobrindo parte do rosto. Mesmo assim ele entrou no buggy e saiu.

Tom passou o dia entrando por varias ruas á ermo até chegar á Praia dos Coqueiros com vontade de resgatar o que já estava perdido para sempre. Ironicamente o dia estava claro e mar calmo.
Mais tarde obteve mais informações sobre o caso: duas irmãs brigaram nas rochas à Praia dos Coqueiros e uma empurrou a outra dentro do mar que estava de ressaca. Citaram o nome de Celeste como a autora do crime, e que teria fugido para Minas Gerais, mas a polícia já estava no encalço.
 O que era para ter sido uma viagem idílica á Jampa convertia-se num pesadelo cujo final parecia estar longe. 
Ao abrir seu notebook, encontrou uma notícia: “O corpo da vítima do crime da Praia dos Coqueiros se encontra no Instituto Médico Legal onde passou pela necropsia. A polícia não conseguiu contato com parentes, que viveriam em Santa Catarina, que pudessem vir á João Pessoa para fazer a identificação.” Ele abanou a cabeça na certeza que teria mais esta missão pela frente. Era o mínimo que poderia fazer por Ciça.

Na manhã seguinte Tom já estava no IML para a identificação do corpo de Ciça, se apresentando como policial e vizinho da vítima e da suspeita do crime. Mais cedo ele fez contato com o delegado Malaquias, seu superior, solicitando mais alguns dias de folga para cuidar dos procedimentos para liberação e translado do corpo de Ciça para Juiz de Fora, e posterior sepultamento. O delegado autorizou, mas não se esquivou da pergunta se ele estaria junto com suas vizinhas naquela viagem. Tom negou veementemente!
O Legista abriu a geladeira do IML e puxou uma espécie de gaveta contendo um corpo envolto num saco plástico com zíper. Tom precisou segurar até o limite da sua suscetibilidade para não desabar num choro compulsivo ante a visão do corpo de Ciça com seu rosto e pescoço inchados, cabelos em total desalinho sendo ainda possível ver parte da sutura no colo. Então, numa alucinação terrível ela abria os olhos e dizia. – Foi tudo sua culpa, mas não vai escapar de mim; vou te buscar!
Tom teve que se segurar para não sair correndo.
Enquanto aguardava algumas formalidades, ele buscou notícias no celular e veio á sentença definitiva. “A polícia de Juiz de Fora, MG, prendeu a suspeita do crime da praia dos Coqueiros em João Pessoa, PB. Celeste de Souza Vergara estava na casa onde residia com a irmã naquela cidade. Foi detida e levada á delegacia. A Polícia de João Pessoa já solicitou o envio de Celeste ao estado da Paraíba onde já existe um mandato de prisão preventiva. Isto deverá ocorrer nas próximas horas.”. - Tom passou as mãos no rosto quase em desespero.

CONTINUA.

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