CONTINUAÇÃO:
SEXTO CAPÍTULO: JUSTIÇA.
Rogério foi nomeado delegado de policia,
assumindo nada menos que três delegacias pela Zona da Mata mineira. Muita
responsabilidade na medida para não deixar espaço à pensamentos, cobranças e
pesadelos.
Um ano depois foi marcado o julgamento
de Teca por homicídio culposo, sem intenção de matar e Rogério foi convocado
como testemunha da relação de conflito que viviam as irmãs Vergara.
No dia do julgamento Rogério foi direto
do aeroporto de João Pessoa para o Fórum. Ele havia engordado, e agora usava
bigode e cabelos um pouco mais volumosos atrás da cabeça. Também surgiram fios
grisalhos nas têmporas.
E finalmente chegava o momento que o
delegado Rogério Mattei foi chamado á tribuna das testemunhas. Discretamente
olhou na direção de Teca, que não olhou para ele. Então lhe ocorreu uma visão:
ela olharia para ele, se levantaria e apontando-lhe o dedo, gritaria em altos
brados. – Esse é o homem que estava com
Ciça em Jampa, eram amantes! É também o homem que fez sexo comigo na praia e
depois nadamos juntos completamente nus! É um canalha, senhores,... Canalha e
assassino! – Por um instante isto o
fez se perder. - Doutor Rogério Mattei? – ele olhou: - Heim? – o juiz
perguntou: - O doutor está bem? – Rogério gaguejou: - Eu?... - a plateia riu
discretamente e o Juiz repreendeu. - Silêncio! – virou-se á Rogério. – O doutor
está se sentindo bem? – ele se recompôs: - Sim! Perdão Meritíssimo; é apenas o
cansaço da viagem. Mas estou bem!
O julgamento prosseguiu. As perguntas foram
previsíveis e respondidas com firmeza. Pesou muito o relato da ocorrência onde
ele impediu que as duas irmãs se agredissem fisicamente num estabelecimento
comercial vizinho ás suas casas. Isto expunha o descontrole das irmãs durante
suas brigas e corroborava a versão da discussão á beira dos rochedos que levou
à tragédia. Não havia o que fazer senão relatar o fato sem considerações de
juízo, embora o promotor as tentasse. Esta temperança e senso de imparcialidade
por parte do delegado mineiro foram elogiados pela imprensa local e o
Ministério Público. Para Rogério; pura covardia.
Então veio o momento da própria Teca
subir á tribuna para depor ao júri popular. Ela repetiu o que dissera á
polícia, reafirmando que elas discutiram partindo para a agressão física e
neste ponto lembrou as marcas de unhadas que ficaram no seu braço. Depois de um
embate onde se estapearam e se empurraram, a bolsa de Cibele abriu despejando
objetos pelos rochedos e Celeste aproveitou para fugir, não percebendo que sua
irmã teria caído no mar. Neste ponto ela abaixou a cabeça e chorou. Perguntada
sobre o suposto homem que estaria se encontrando com sua irmã em Jampa, ela
afirmou que tinha certeza disto, ao que o promotor rebateu justificando falta
de provas e testemunhas disto. Rogério se arrepiou ao imaginar uma daquelas
cenas de filmes onde alguém se levantaria da plateia gritando: - Eu o vi! O amante da morta era aquele
bigodudo ali! – e apontava para ele, que passava a mão na testa suada,
ansioso para o julgamento chegar ao fim!
Perguntada como se declarava Celeste
respondeu: – Inocente! - ouviu-se um “oh” em coro por todo a plenário. O juiz
ordenou silêncio e depois das considerações e ritos de praxe, os jurados
partiram á sala secreta para a sentença.
Para Rogério aquilo parecia um pesadelo
sem fim. Havia uma tênue esperança que fosse absolvida por conta da tese de
legítima defesa, mas foi condenada. Ela se manteve altiva enquanto o juiz
proferiu a sentença de vinte anos de prisão pelo crime de homicídio culposo,
sem explícita intenção de matar, porém, com o agravante da fuga e do falso
testemunho sobre um suposto amante da irmã, configurado como obstrução da
justiça e perjúrio. Informou ainda que a prisão seria em regime fechado e que a
ré fosse imediatamente conduzida á Penitenciária de Recuperação Feminina Maria
Júlia Maranhão, na cidade de João Pessoa, para imediato cumprimento da pena. A
imprensa informou depois que o advogado não entraria com recurso.
A partir daquele dia, o delegado Rogério
Mattei se lançou com afinco á sua função. Chamavam-no de “homem bom”.
Precisamente o que ele não se considerava nem de longe.
Sempre sonhava com Ciça á beira dos
rochedos querendo dizer algo. Sentia sua presença, percebendo seu vulto com o
canto dos olhos. Mas ao se virar, não havia nada. Chegou á ouvi-la chamando-o
dentro de casa ou á entrada, e isto o assustava.
Ás vezes procurava-a no corpo de outras
mulheres, mas depois do sexo vinha uma imensa frustração. Algumas daquelas
mulheres o procuravam depois buscando por amor, e era exatamente o que ele não
tinha para dar.
Num desses encontros, buscando as mesmas
carícias que encontrava em Ciça, se ergueu para beijar a mulher e viu o rosto
de Ciça do jeito que estava no IML. Ela olhou-o e disse: - Canalha!... Você não vai escapar de mim!... Nunca! – apavorado ele
se levantou da cama cobrindo o rosto, e se agachou ao chão aos prantos. Mais
apavorada ainda a mulher buscou suas roupas e saiu correndo do quarto!
Contudo, um pensamento começava a lhe
ocorrer com insistência: e se Teca se apaixonou por ele, e por isso o poupou? Rogério ensaiou visitas á ela na
penitenciária, chegando a mesmo a reservar quarto em hotel de João Pessoa; mas
desistia no último instante.
Passaram sete anos, e Rogério agora era
um “sessentão”. A vida seguia entre uma investigação e outra e uma espécie de
aptidão para resolver casos intrincados lhe valendo cada vez mais deferência de
“homem bom”. O Doutor Mattei até gostaria de acreditar nisso.
Tempos depois soube que Teca ganharia
liberdade condicional nos próximos dias, e Rogério teve vontade de arrumar suas
malas e partir para Jampa e recebê-la assim que saísse do presídio. Porém ele
não era mais o mesmo: ganhou barriga, cabelos grisalhos e medo. E ela? Talvez
não estivesse preparada para a surpresa de não reencontrar o homem maduro,
“másculo” e bronzeado com camisa aberta no peito que lhe despertou desejo.
Então buscou nas tecnologias antigas uma forma mais delicada de chegar á ela.
Uma carta. Papel, envelope, caneta e coragem:
“Não
sei como começar, mas imagino que um pedido de perdão por todos esses anos de
silêncio pode ser um bom começo. Sinto que não fui correto com você no dia do
seu julgamento quando subi á tribuna para aumentar sua carga de acusações. É
covardia me esconder por trás das minhas atribuições, pois tinha sido nomeado
delegado de polícia, e foi exatamente o peso desta nova atribuição que fez com
que eu guardasse distância do caso. Não sei se poderá me perdoar. Você nunca
mencionou meu nome a policia de Jampa, e só tenho a agradecer por isto, mas não
sei se entendi seu significado. Os homens demoram a entenderem estas minúcias
do comportamento feminino, e confesso que me sinto um troglodita ao não ter
compreendido. Lembro-me do que você disse: que o que tivemos lá foi lindo, mas
não sabíamos no que ia dar. Mas o destino não nos deixou ver o que ia dar. Eu
quero encontra-la na saída do presídio no dia da sua soltura. Estou só, e você
também, e temos uma história para terminar, não é Teca? É possível o que estou
propondo? Pularmos a parte ruim e seguirmos pela parte boa? Eu estou de malas
prontas, aguardando sua resposta. Eu amava o jeito que você me chamava de Tom.
Assim: do seu eterno, Tom”.
Palavras escolhidas com carinho e
cuidado. A carta foi lida diversas vezes antes de ser posta no correio.
Rogério novamente era Tom: o gatão de
meia idade tirando onda em Jampa!
CONTINUA.
Muito bom! Esperando o final desta história. Vão ficar junto ou Rogério vai assumir o sobrenome pelo menos para os leitores? Aguardando.
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